
Há quase 70 anos, cristãos e muçulmanos se reúnem todo final de julho na pequena cidade de Vieux-Marché (Côtes d'Armor), para o perdão dos Sete Santos, onde os momentos de trocas e orações são pontuados por fest-noz, cuscuz e linguiça-panqueca.
Sentados sob uma tenda montada para o fim de semana, Brahim e Andrée acabaram de se conhecer: "Ele me ajuda a revisar meu árabe", comemora o aposentado bretão, lançando o "murajaea" (exame em árabe).
“Venho desde 1963-64, provavelmente sou a mais velha da assembléia hoje”, observa.
Por sua vez, esta é uma novidade para Brahim, de fé muçulmana: “Há anos ouço falar desse perdão bretão, há anos quero chegar a ele.
Na origem deste indulto, o islamólogo francês Louis Massignon (1883-1962) teve a ideia de organizar esta peregrinação islamo-cristã em 1953. Enquanto assistia ao indulto do Mercado Velho, ficara intrigado com a letra de um antigo hino bretão cujos versos eram muito semelhantes a parte da sura XVIII do Alcorão ("Povo da gruta"), contando a história dos sete mártires de Éfeso, emparedados vivos e ressuscitados citado.
Em seus primeiros dias, o perdão atraiu principalmente intelectuais muçulmanos de Paris. Mas há vários anos, e em particular os vários ataques que afetaram a França, os muçulmanos locais também se juntaram às festividades.
“Em Lannion, existe uma comunidade de 300 a 400 indivíduos que frequentam locais de culto e alguns deles participam neste evento”, especifica o imã de Lannion, Mehand Iheddadene.
"Bela Aventura"
Após o assassinato do padre Jacques Hamel em 2016 em Saint-Etienne-du-Rouvray por dois radicais islâmicos, a comunidade muçulmana de Lannion ficou "tão chocada com o que aconteceu que queria se aproximar da comunidade católica de Lannion", testemunha Gersende de Villeneuve, membro do coletivo ESPOIRS, coorganizador do evento.
"Finalmente, de uma tragédia nasceu uma aventura muito bonita!", sublinha.
O perdão ocorre ao longo de três dias com destaque para o domingo, quando há missa católica na capela da vila, seguindo-se uma caminhada de cem metros até à “estela da paz” que representa o tempo dos não crentes e por fim o tempo muçulmano na fonte, no coração da floresta.
Sob a marquise, grandes potes de cuscuz aguardam os cem participantes, que continuarão a trocar informalmente.
“Os muçulmanos me ajudaram a ser cristão”, confidencia Dom Pascal Gollnisch, perdoador desta edição. “Acho importante apoiar esforços onde cristãos, muçulmanos e não crentes se encontrem no mesmo lugar e possam se ouvir e compartilhar valores comuns”, acrescenta aquele que também é diretor geral da Obra do Oriente.
Para esta edição, o tema "água" foi escolhido. Sob a chuva bretã, este assunto inspira Dom Gollnisch: "Ele toca cristãos e muçulmanos, que veem na água uma criação de Deus que deve ser respeitada, mas também fala aos agnósticos que estão cientes da falta de água. Estamos muito conscientes de que devemos agir juntos".
Para muitos, o perdão dos santos de setembro é um momento essencial para o bom entendimento entre as diferentes religiões: “Já só fazendo esforços, o caminho ainda é longo, então se pararmos com iniciativas como esse perdão, será o fim”, segundo Ahmed Hassini, capelão da prisão de Saint-Malo.
“Devemos continuar com a esperança de que uma hora ou outra haja um clique, porque enquanto estigmatizarmos as pessoas, o discurso não será suficiente. Precisamos muito nos conhecer”, continua.
O Conselho Editorial (com AFP)